O que as famosas roupas do Steve Jobs (camiseta preta, calça jeans e tênis) e as “marmitinhas” de quem faz dieta tem em comum?
Essas roupas não viraram uma marca só por quem a vestia. Esse estilo ficou muito conhecido e foi muito copiado por que tinha um motivo, uma explicação. Da mesma maneira, e quem já fez dieta sabe, o planejamento alimentar e as famosas “marmitinhas” são importantes para o sucesso. O objetivo é simples: reduzir o número de decisões necessárias para seguir com o seu dia.
Steve Jobs se vestia assim todo dia, por que ele já poderia começar o dia pensando na empresa, nos novos projetos, tendo ideias, e não se incomodando em frente ao espelho se perguntando o que vestir.
Cada decisão que tomamos tem peso. O jeito mais fácil de pensar é que temos um “limite de pontos” que podemos usar durante o dia para decisões (vamos dizer que 500). Algumas decisões custam 10, outras 50, e as mais difíceis podem chegar a 200 ou 300.
Podemos gastar um pedaço significativo do nosso total diário com decisões que não importam muito. O que comer? O que vestir? Qual caminho seguir? Fazer X ou Y? De repente, acontece uma situação que seria um 300, e só temos 200 pontos disponíveis. Nossa decisão, se tomada, vai ser, no mínimo, duvidosa.
Acontece do mesmo jeito com desenvolvedores. A produtividade de desenvolvedores e profissionais criativos ainda é uma incógnita. Por ser algo extremamente variável, temos grande dificuldade de mensurar. Produtividade vai significar uma coisa diferente para cada profissional, empresa, contexto e projeto.
A primeira tentativa, e talvez a mais comum, seja tentar medir o output: linhas de código, commits, tarefas, pontos de função, etc. O problema é que essas medidas assumem que o trabalho criativo seja linear, estável e reproduzível. Tratar desenvolvedores como uma indústria de produção pode ser fatal.
Todo trabalho criativo (isso inclui músicos, designers, programadores, escritores), tem, no fundo, a mesma natureza. São decisões. Decidimos a estratégia de integração. As cores do banner. A frase do refrão. A qualidade do produto final está diretamente ligada a qualidade das decisões, não necessariamente ao tempo de fato aplicado.
Sendo assim, esperar que uma pessoa, contratada para “trabalhar” 8 horas por dia, vai realmente aplicar 8 horas por dia ao trabalho é, de maneira leve, bastante ingênuo. Ter períodos de descanso é absolutamente necessário para que a qualidade do trabalho seja superior. Desenvolvedores trabalham em ciclos de atividade intensa e descanso, ao contrario de intensidade e volume constantes de áreas como produção industrial.
O trabalho criativo, normalmente, exige muita atenção e necessita que guardemos e consideremos muitas variáveis ao mesmo tempo, o que causa um cansaço desproporcional ao tempo. Uma boa metáfora é: um carro se deprecia com o tempo, mas o que mais causa depreciação, normalmente, são os km rodados. Mas rodar 5mil km em um dia vai gerar um desgaste muito maior do que rodar 100km por dia por 50 dias.
Manter os desenvolvedores em alta intensidade vai causar burnout e rotatividade. Ter o período de descanso aumenta, e muito, a produtividade e a efetividade nos períodos de atividade. É durante os períodos de baixa intensidade e pouca atividade que aprendemos, buscamos informações diferentes e melhoramos, principalmente de maneira horizontal (Em conhecimentos diferentes. Se aprofundar no mesmo assunto seria uma melhora vertical).
Mas isso não é desculpa para não fazer nada, ou ficar vendo vídeos de gatinhos no youtube. Do mesmo jeito que alguns trabalhos são bastante complicados, muitos outros são triviais. Devemos ter honestidade e humildade para reconhecer cada um deles e reagir de acordo. Fazer CRUDs enjoa, mas não esgota. Planejar a nova arquitetura da aplicação esgota, mas, pelo menos pra mim, é ao mesmo tempo revigorante.
Para fechar, não tente forçar ninguém a trabalhar mais horas. Não espere que ninguém se dedique mais do que o “normal” com relação a tempo. Incentive a melhora das decisões. Construa uma cultura de troca de conhecimento e melhora contínua. Premie boas ideias, promova ótimas ideias e discuta ideias ruins.